Gestão de Pessoas e Bem-estar no Terceiro Setor

Olá! Se você está chegando agora no Portal do Impacto e ainda não sabe que este texto é o n° 2, de uma série de 6, falando da relação do Bem-estar no Terceiro Setor e práticas da Gestão de Pessoas, clique no link abaixo e confira a introdução deste tema.

Caso você ainda esteja aqui, vamos lá!


Como podemos tornar o Terceiro Setor mais diverso e inclusivo, melhorando assim, o bem-estar de seus agentes de mudança?


Para procurar respostas para esta questão fui ao encontro não só de pesquisas e livros, mas também de amigos que dividem comigo a extensa caminhada no setor da transformação social, pois, das longas conversas dos corredores e cafés, partimos de uma premissa: temos muito o que avançar nesta área, já que o setor da “ajuda ao próximo” ainda é muito desigual.


Se formos falar sobre Diversidade, que segundo a Associação Pacto de Promoção da Equidade Social refere-se “a diferenças de gênero, raça, orientação sexual, idade, habilidades, cultura, religião e outros aspectos que tornam as pessoas únicas”, já somos uma área pouco diversa.


Em relação ao gênero, as mulheres são as mais presentes no setor, com 65% dos cargos assalariados, de acordo com pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de 2017, porém, como pontuado pelo artigo de Daiany França, para o Portal do Impacto em 2022:


“O terceiro setor é um microscópio da nossa sociedade, ou seja, também

apresenta disparidades salariais entre homens e mulheres; barreiras em relação à raça, etnia, gênero e sexualidade; discriminação em relação às mulheres que são do Norte ou Nordeste; mais obstáculos quando se trata das mulheres ascenderem a cargos de gestão e liderança; assédio e outras violências de gênero”.


Quando falamos de raça, a pesquisa do Ipea de 2019, afirma que pessoas brancas representavam 63% das pessoas empregadas em OSCs no Brasil, sendo complementado pelos dados do GIFE, de 2018, que mostram que somente 8% das organizações que responderam ao censo contam com negros em seus conselhos deliberativos. 


O livro “Cuidar de quem cuida”, de Sophia Maggi Góes e equipe do Instituto ACP, mapeia grande parte desses dados, que ainda são poucos no país. Nele, a presença de indígenas, apontada pelo Pipe Social (2021), é de apenas 1%, e o número de pessoas com deficiências e LGBTQIA+, que atuam no campo social, ainda é desconhecido.

Ao observarmos como essa realidade se dá na prática, Alexandro Fernando da Silva,  Educador Social há mais de 20 anos, na cidade de Campinas-SP, sendo um homem negro, relata: “As barreiras [para quem é considerado dos grupos minorizados] começam no processo seletivo, com algumas perguntas, feitas pelos recrutadores de algumas ONGs, que chegam a ser ofensivas, como, por exemplo: características dos meus relacionamentos afetivos, se tenho filhos, se pago pensão, como vou me locomover para o trabalho e outras questões que não tem a ver com o que a vaga pede”.


Alexandro continua: “Falar sobre diversidade, no Terceiro Setor, é muito raso. Se fala muito, mas não é feito. Inclusive, em lugares que se trabalha com a garantia de direitos. A gente garante os direitos dos usuários do serviço, mas não tem quem garanta os nossos direitos. Sentimos nossos direitos sendo violados. Acreditam que ao contratar uma pessoa trans estão fazendo um super trabalho de diversidade e inclusão, mas elas estão sendo contratadas em subcargos.  Não há uma real inclusão, ela é virtual, pois não se cria uma estrutura para isso. Não há contratação de pessoas com vários tipos de deficiência. E o argumento de que não há recurso, é sempre uma carta na manga”.


O termo “Atração” corresponde a essa fase do processo seletivo. Significa que a organização deve atrair pessoas alinhadas à sua missão e com as competências necessárias para o cargo a ser preenchido. Neste momento, a equipe responsável por esta ação, deve estar preparada e qualificada para o perfil que desejam encontrar, e é aqui que o objetivo de inclusão começa.


Sabe-se que a grande maioria das instituições, presentes no terceiro setor, não contam com um departamento específico de Gestão de Pessoas. Sophia Góes, explica: “Muitas organizações do campo social possuem dificuldades para estruturar processos e metodologias dedicados a esse cuidado, tanto por fatores culturais que as levam, por exemplo, a não considerarem o tema prioritário, quanto por desafios estruturais, tais como a restrição de recursos financeiros e humanos ou mesmo a falta de conhecimento sobre o tema”.


E realmente, se queremos ver alguma mudança no problema centenário de desigualdade social do nosso país e do mundo, a começar pela inclusão de pessoas em suas mais plurais diversidades no mercado de trabalho, isso precisa ser proposital e estratégico. Não dá para continuar esperando que isso mude “naturalmente”.


As práticas eficazes de promoção do bem-estar, precisam ser adaptadas aos valores e à visão das organizações sociais e, aplicadas a todas as suas esferas. Não dá para ser desfrutado apenas por uma classe de pessoas, composta muitas vezes pela diretoria da instituição. Se ainda não sabem como fazer, é necessário buscar informações qualificadas e se atualizar. 


O módulo 1 do “Guia de Gestão de Pessoas do Terceiro Setor”, apresentado no texto de introdução desta série (com link no início deste artigo), sugere uma sequência de ações possíveis para quem deseja começar, inclusive propondo outras referências de materiais.


Mas, só para lembrar, antes mesmo de sair contratando, com a melhor das intenções, pessoas para diversificar sua equipe, preste atenção nesses aspectos que podem vir antes:


– Busque e ofereça treinamento e educação sobre diversidade e inclusão

– Fomente um ambiente de trabalho inclusivo e acolhedor

– Fortaleça uma cultura de trabalho aberta a transformações

– Tome medidas para garantir igualdade de oportunidades e tratamento justo para todos os funcionários

– Estabeleça processos que possam ser desenvolvidos, avaliados e aprimorados continuamente


E por fim, se comprometa, em nível pessoal e organizacional, com a mudança. É necessário que repensemos os modelos pré-estabelecidos, e ainda reproduzidos em nossa sociedade, em nossa equipe, entre os nossos amigos, e que possamos contribuir efetivamente para a transformação desta realidade.


Para concretizar a urgência destas iniciativas, faça o “Teste do Pescoço”, criada originalmente pelo Geledés – Instituto da Mulher Negra, para discutir o preconceito racial, mas que pode ser aplicado a outros grupos minoritários: levante, mentalmente, seu pescoço e observe seu local de trabalho, seu organograma, seus voluntários e responda o quanto diverso ele está neste momento e o quanto ainda pode ficar.


Há uma reparação de injustiça social histórica que precisa ser feita e que o Terceiro Setor precisa fazer parte.

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