Só medir apenas o relevante, bora lá
Há um paralelo entre, por um lado, o Marco Lógico e a Teoria da Mudança e, por outro lado, os OKRs (do inglês
Objectives and Key Results). Os primeiros são ferramentas muito usadas na área social, e o segundo ferramenta importante na área de empresas e negócios. Ambas começaram a ganhar espaço a partir da década 1970 em contraposição a um modo de gestão que era baseado na hierarquia vertical e no controle de processos e atividades.
No (meu) último artigo aqui do Portal eu comentei sobre a implementação da Teoria da Mudança. Agora nesse artigo irei comentar sobre o livro de John Doerr,
Measure what Matters
(Medir só o que é relevante), que foi lançado em 2018 e mostra justamente, a partir de depoimentos de um grupo de grandes empresas que ele assessorou com a metodologia, as consequências positivas da gestão baseada em resultados acordados de modo participativo.
Recomendo a leitura do livro para os gestores de ONGS (no original) ou em (em português). O livro confirma e reforça a importância de ter objetivos claros e definidos de forma participativa, com relação de causa-e-efeito entre eles, e de definir indicadores que sejam poucos e relevantes de modo a (só) acompanhar o que realmente importa.
O livro
O livro
Measure What Matters tem apresentação de Larry Page, co-fundador da Google, que começa por dizer que não faz apresentações de livros. Mas que aceitou fazer essa apresentação “porque (o autor) John Doerr deu um tremendo presente ao
Google
em todos esses anos. Os OKRs nos ajudaram a crescer 10 vezes mais em vários momentos. Nos ajudaram a tornar viável a nossa missão loucamente corajosa de “organizar as informações do mundo”. Foram os OKRs que me mantiveram e ao restante da Companhia dentro dos prazos e no caminho certo, quando mais precisávamos. E eu quero muito que as pessoas ouçam o que ele tem a dizer”.
OKRs é a abreviatura para Objectives and Key Results (Objetivos e Resultados-Chave). Para o autor John Doerr, o pai dos OKRs foi Andy Grove, um dos fundadores e presidente da
INTEL
por vários anos. Outras personalidades também abordaram o tema, como Frederick Taylor e Henry Ford na 1ª metade do século XX; e também Peter Drucker, esse último conhecido como o criador da APO (Administração Por Objetivos) a partir do seu livro clássico, The practice of management.
Dos anos 1960 até 1990, muitas empresas passaram a adotar a gestão por objetivos (APO, de Peter Drucker), e os equívocos de implementação foram se tornando cada vez mais evidentes. Os objetivos eram planejados centralmente e empurrados hierarquia abaixo. Em outros casos, eles ficavam estagnados por falta de atualização frequente; ou presos e restritos a alguns poucos “silos” (grupos); ou reduzidos aos KPIs (Key Performance Indicators) que não passavam de números sem alma e sem contexto. E o pior ainda era quando o desempenho vinha atrelado a salário e bônus. Como observa Doerr, se correr risco poderia ser penalizado, por que alguém iria querer se arriscar? No final dos anos 90 o método caiu em descrédito, e o próprio Drucker já o considerava como “apenas mais uma ferramenta, e não a grande cura para as ineficiências da gestão”.
No entretanto, pode parecer contrassenso mas foi em 1999, com o método da APO já fortemente desacreditado, que John Doerr conquistou Larry Page e os outros sócios da Google para o uso das OKRs na companhia, tendo por base a sua experiência na Intel onde o seu mestre fora Andy Grove.
Depois da Google, muitas outras empresas do setor de tecnologia também foram sendo conquistadas para o método, setor em que agilidade e trabalho em equipe são imperativos. Ao longo do livro, Doerr cita vários exemplos de casos de empresas adotantes, como as grandes do Vale do Silício (AOL, Drop-box, LinkedIn, Oracle, Slack, Spotify, Twitter), ou as grandes fora do Vale (BMW, Disney, Exxon), ou
pequenas startups, ou ainda do setor não-lucrativo como a
Fundação Bill & Melinda Gates.
Logo na introdução, Doerr explica que os OKRs representam um protocolo
colaborativo para definir objetivos para empresas, equipes e indivíduos. Ou seja, representam uma metodologia de gestão que ajuda ou garante que todos da empresa concentrem os seus esforços nas mesmas questões relevantes.
E o autor vai além, “um objetivo é simplesmente O QUE é para ser atingido, nada mais e nada menos. E por definição, objetivos devem ser significativos, concretos, orientadores de ações e (idealmente) inspiradores. Quando desenhados e implementados adequadamente, funcionam como vacina contra o pensamento e a execução difusos.”.
Já os Key Results (ou Resultados-Chave) monitoram e servem como referência para o COMO chegar ao objetivo. Objetivos-Chave efetivos são específicos e referenciados no tempo, agressivos porém realistas. A maior parte deles é mensurável e verificável. Na maioria das vezes, o ideal é ter entre 3 a 5 resultados-chave por objetivo; pode ser tentador incluir um número maior, mas é um erro.
O livro está dividido em duas seções complementares. A primeira aponta os quatro superpoderes dos OKRs, que são:
- Foco e comprometimento com prioridades;
- Alinhamento e conexão com o trabalho das equipes;
- Busca da prestação de contas;
- Esticar ao máximo o limite do possível, e ter liberdade para fracassar
Já a segunda seção trata das aplicações e implicações das OKRs para o novo mundo do trabalho, a saber:
- Gestão continuada de desempenho: os sistemas de avaliação de desempenho, seja anual (APO) ou mesmo trimestral (OKR), correm o risco de se tornarem obsoletos. É preciso um novo modelo de RH (Recursos Humanos) adaptado aos novos tempos, baseado em Conversações (constantes); Feedbacks (em tempo real); e Reconhecimento (dos pares, baseado em critérios claros, e vinculado aos objetivos e estratégia da organização);
- Melhora contínua da implementação do método, estendida a todas as áreas da organização;
- Implementação facilitada da cultura da mudança (exemplifica com o caso do uso dos OKRs pela banda de
Bono Vox, que serviu para nortear o trabalho do grupo para salvar vidas na África)
Para concluir, eu ainda destaco algumas das citações utilizadas pelo autor (na seção 1 do livro), que traduzem muito bem o espírito do livro, que é o de medir apenas o que for realmente relevante.
- Se você não sabe aonde você está indo, você pode não chegar lá (Yogi Berra)
- Ter ideias é fácil. A execução é tudo (Mantra de John Doerr)
- Existem muitas pessoas trabalhando tanto e alcançando tão pouco (Andy Grove)
- Menos é mais. Um limite de 3 a 5 resultados-chave por objetivo nos leva a escolher o que realmente é importante (Andy Grove)
- As empresas ruins são destruídas em tempos de crise. As boas companhias sobrevivem às crises. As grandes companhias se aproveitam delas (Andy Grove fazendo referência ao caso dos microprocessadores da Intel em 1986)
- São as nossas escolhas …. que mostram quem nós realmente somos, muito mais do que as nossas habilidades (J.K. Rowling)
- Não permita que a perfeição seja o inimigo do bom (Voltaire)
- Inovação significa dizer não para mil coisas (Steve Jobs) Daí o fato de ter muitos objetivos pode obscurecer o foco do que realmente conta.
- Nós não empregamos pessoas inteligentes para dizer a elas o que devem fazer. Nós empregamos pessoas inteligentes para que elas nos digam o que fazer. (Steve Jobs)
- Em Deus nós acreditamos; todos os outros devem apresentar dados (W. Edwards Deming)
- Se a escada não está apoiada na parede certa, todo o degrau que subimos está nos levando mais rápido para o lugar errado (Stephen Covey)
- A gente não aprende da experiência ….. a gente aprende da reflexão sobre a experiência (John Dewey)
- O maior risco de todos é não assumir riscos (Mellody Hobson)