Maurício Pestana: negro, se você estudar, vencerá! Será?

Que a educação é chave para a ascensão social e econômica, não há dúvida, nem discussão. Porém, o que está ocorrendo em nosso país é que, cada vez mais, nos bancos escolares, vêm se acentuando as diferenças no estudo entre brancos e negros.

Pesquisa encomendada pela Fundação Telefônica Vivo ao Núcleo de Estudos Raciais do Insper (Neri) traz dados estarrecedores sobre a principal disciplina e ferramenta de trabalho nos dias atuais e no futuro, que é o conhecimento tecnológico.

A pesquisa Tecnologia e Desigualdades Raciais no Brasil teve como objetivo investigar desigualdades raciais no acesso à tecnologia e seus desdobramentos em diferentes etapas da trajetória escolar, desde o ensino básico até o ensino superior.

Os resultados indicam desigualdades raciais relevantes no acesso de alunos a tecnologias, considerando a presença de infraestrutura adequada nas escolas e o seu uso pelos professores para fins pedagógicos, mensuradas a partir de dados do Censo Escolar e do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica).

A pesquisa mostra, por exemplo, um aumento de 10 pontos no índice de exposição à tecnologia no 5º ano do ensino fundamental, associado a uma nota 18,5 pontos maior em matemática (em uma escala de 0 a 500).

Mas, no recorte racial, alunos negros do mesmo ano obtêm, em média, 14,5 pontos a menos em matemática, na média do país, quando comparados com alunos brancos com o mesmo nível de exposição à tecnologia. Esse diferencial é de 4 pontos quando são comparados alunos das mesmas regiões e com as mesmas condições socioeconômicas.

Esses fatores mostram que a diferença de desempenho entre negros e brancos está fortemente relacionada a fatores sociais e regionais, que são reflexo de disparidades raciais históricas. O que significa dizer que estamos formando pessoas na mesma base escolar, mas com diferenças de aprendizagens em áreas estratégicas, ou seja, reproduzindo desigualdades históricas do passado no presente e para o futuro.

Se, já no passado, a política educacional privilegiou uma certa camada da população brasileira, e os números mostram isso, com a participação dos negros inferior à dos brancos na universidade, no ensino médio e no fundamental, hoje, mesmo com uma presença maior, as diferenças no aprendizado continuam desiguais.

Todavia, iniciativas como essa da Telefônica Vivo, preocupada em jogar luz no problema, mostram o envolvimento do setor privado no presente na desconstrução de políticas e ações culturais excludentes, seja do ponto de vista social ou racial. A realização da pesquisa patrocinada pela gigante da telefonia brasileira demonstra isso.

Outras iniciativas do setor privado também têm focado no problema. Empresas como o Alicerce Educação – que se dedica ao reforço escolar no pós-turno, dando ênfase a disciplinas como português e matemática, não só para crianças e jovens, mas em parceria com várias empresas – investem na revisão educacional de funcionários.

O analfabetismo funcional é uma realidade brasileira, e ações como essas auxiliam para a solução do problema. Com o olhar voltado também à questão racial, o Alicerce, além da preocupação do tema racial em suas disciplinas, mantém um comitê de igualdade racial.

Existem várias iniciativas do setor privado mobilizado para reduzir as desigualdades sociais e raciais no Brasil. O fato deste setor ter se sensibilizado para o problema somente neste século faz com que esse trabalho seja muito mais árduo – afinal, temos um atraso de mais de 100 anos em que nada foi realizado, por exemplo, no âmbito racial.

Mas hoje, com as informações sendo democraticamente disponibilizadas, não há como continuar de braços cruzados, principalmente com os números que esta pesquisa nos traz. Nem esperar por governos para resolver o problema e tirar o Brasil do triste lugar de ser um dos países mais desiguais do mundo.

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